Dentre as velhas platitudes de sempre nesses eventos, um “ponto de ação” a destacar na 16ª Conferência do Movimento dos Não Alinhados [Nota A] em Teerã, que termina hoje no final do dia, é a iniciativa sobre a Síria. Ainda não se conhecem os detalhes, mas o conteúdo pouco importa, porque, venha o que vier, será furiosamente contestado e talvez dê em nada. Só as grandes potências moem o que queiram ver moído, e na própria mó.
Mas aqui o que interessa é a forma. O ministro de Relações Exteriores do Irã Ali Akbar Salehi apresentou [1] a entusiasmante ideia [NotaB] de constituir-se um grupo dentro do Movimento dos Não Alinhados para buscar um acordo que ponha fim à crise na Síria. O grupo reúne os países que ocuparam a presidência do Movimento dos Não Alinhados, passado, presente e futuro – Egito, Irã e Venezuela – mais o Líbano e o Iraque.
Muito evidentemente, aí está um desses raros momentos em que se pode ver, ainda em formação, um novo “centro de gravidade” na geopolítica da região do Oriente Médio. É formação intrigante, porque o presidente Mohamed Mursi do Egito falou abertamente de “mudança de regime” na Síria [2], quando se sabe que Irã e Venezuela não aceitam irrestritamente sequer o conceito. Mas, ao que parece, os três partilham, como ponto comum, que a ideia de que a ‘transição’ que venha a acontecer tem de ser processo no qual só os sírios atuem, sem qualquer intervenção externa.
É a diplomacia iraniana exibindo seus melhores talentos, mostrando alta mestria na arte do possível. O que interessa infinitamente mais que todo o resto, do ponto de vista do Irã, é que Teerã e Cairo partilham afinal a mesma plataforma regional sobre a Síria. Os dois países são membros da Organização de Cooperação Islâmica; e o Egito é também membro da Liga Árabe.
O “consenso regional” é que tudo que EUA e Arábia Saudita tanto trabalharam para construir (ou inventar) acaba de ser pulverizado. [Nota C]
A debâcle da Turquia na questão síria[3] está-se convertendo em questão grave. A “entrada” do Egito força a Arábia Saudita a mudar de rota. A imprensa iraniana deixou bem claro que está previsto algum tipo de reaproximação entre Teerã e Riad. [4] A restauração de laços diplomáticos entre Egito e Síria também obriga a Turquia a refazer os seus cálculos estratégicos.
Não é questão de somenos para Teerã que Mursi tenha declarado o Irã “parceiro estratégico” do Egito. [5] Até a rádio Voz da América admitia, em comentário, que o simbolismo da visita de Mursi ao Irã “preocupou países que tentam isolar o Irã, principalmente os EUA, país há longos anos aliado do Egito”. [Nota D]. O melhor que a Voz da América conseguiu produzir, em matéria de comentário [e prêmio de consolação], foi que a visita de Mursi não significa que o Egito “aprova irrestritamente o Irã”; e que “a aproximação aparente pode não passar de moeda de barganha” nas negociações do Egito com os EUA.
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